terça-feira, abril 29

Viva Cabo Verde!

Lá longe, no além-mar, num cantinho de África espalhadas,
As ilhas hesperitanas conquistam o seu lugar no mundo;
Em cada bela ilha, cada filho tem um orgulho profundo
E, no conjunto, são todas, sem excepção, igualmente amadas.

Com aquele arquipélago (onde nunca se viram serras nevadas
E em que não correm rios, nem sequer por um só segundo,
Mas onde todos os dias se vê o mar e sonha-se com o seu fundo)
Todo o cabo-verdiano se identifica, nas suas longas jornadas:

No cantar do seu honroso hino e da sua melódica morna;
No espalhar da sua morabeza e no abanar da sua bandeira,
Com aquele espírito fraterno e altivo que nunca se suborna;

Pela musicalidade do seu crioulo e pelo rebolar da coladeira;
Pelo orgulho caboverdeano que de todos os seus filhos se entorna...
Viva Cabo Verde, terra amada e pátria para todos, sem fronteira!

quinta-feira, abril 24

Doce Cativeiro

A primeira vez que te vi, estavas lindamente retraída;
À segunda, tuas alegrias já se anteviam mais soltas;
À terceira, os meus pecados todos, sem voltas,
Confessei-te e propus-te que minha fosses para a vida.

Subitamente, aprazível mudança estava estabelecida:
Minha e tua vidas entrelaçadamente envoltas,
Teus cheirosos cabelos, de pontas longamente soltas,
Eram propriedade minha... E tu, toda consentida!...

Quando ninguém me apetecia, tornaste-te na musa
Que me cativou o coração, discreta e merecidamente;
E em momento nenhum pude presentir-te confusa.

Então de amor te enchi! Apaixonei-me perdidamente
E o meu consciente desde então, até agora, se escusa
De indagar o porquê deste desejo sempre presente.

terça-feira, abril 22

"De cor"?

"Preto", "negro" e etc.... permanece tudo numa boa;
Com "africano", pela minha origem, persistirei ufano...
Contudo, "de cor" irrita-me, põe-me atroz e insano,
Porque nada mais é que um cuidar literalmente à toa.

Esse atributo, que, tão somente, a ignorância me soa,
Não me inferioriza nem me causa o mais pequeno dano;
De longe não me atinge, pois neste assunto sou veterano...
Mas não me cai bem, quando da tua cínica boca ecoa.

Tu, que na África só acumulaste vergonha e desmando,
Torturaste, por séculos, o povo que da sua raça se orgulha
E lá te misturaste durante todo o teu humilhante comando,

Agora, na tua terra, com uma mente vazia que me embrulha
Nessa designação sem nexo ("de cor"?), tens receio - falando -
Que me ofendas, se exprimes o que vês: "negro como hulha"?

segunda-feira, abril 21

Sofrimento

"Ah, como eu sofro!" - dizia a outra numa antiga novela
A representar um papel qualquer... tudo e sempre a fingir.
Pois eu digo que muito sofro e não estou nunca a mentir:
Sofro de saudades do meu conto de fadas: minha cinderela.

Vou morrendo aos poucos aqui, desterrado, longe dela...
E morro definitivamente, se ninguém se dignar a me acudir,
Para esta minha nostalgia, de algum modo mágico, sacudir.
Dá-me, ó Venus, força! Socorre est'alma sofrida que t'apela!

Acudam-me, ó eternos Céus! Acode-me, ó valente mar!
Acode-me tu que és clemente e benévola, ó força divina,
Atende às minhas preces, cessa-me este meu penar!

Se a não trazes nem me levas, por obséquio, vê se me ensina
Como proceder para esta melancólica saudade dissipar;
Foca-me a tua luz e maldiz, de vez, esta minha negra sina.

quinta-feira, abril 17

O Poeta

Eis o poeta que chora sua dor com amargura!
O poeta que sofre, carpe e verseja;
Poeta que se derrete e morre por quem deseja;

Eis o poeta que canta sua dor com doçura!


Carpe-lhe o peito de desventura,
Mas entrega-se ao sacrifício, qual seja!
Platónico é e paradoxalmente almeja
Devotar seu âmago à noite escura.

De um modo sóbrio expõe sua alma:
Com tanto penar e carpir sem partilha,
Lá está o poeta com sua irónica calma!

Vê em algo macabro sobeja maravilha;
Idealiza a amada, tem-na como divina palma*...
Canta e chora sua dorida nostalgia em pilha*!


*Palma - Prémio
*Pilha - Rima

Fogo, 28 de Agosto de 01

quinta-feira, abril 10

Desejo

Gostava de te ter aqui comigo neste pequeno colchão
Para nos deleitarmos na sina do primeiro pecador;
Tu aquecias-me todo, derretendo o teu amor
E eu cobria-te com o grosso manto da minha paixão.

Ter-te-ia nua e do teu corpo se ocupava cada mão;
Roçava-me em ti, apalpava teu desejo, sentia teu calor...
E, todo compenetrado e molhado do teu perfumado suor,
Comunicava-me contigo só com o pulsar do meu coração.

Ter-te-ia, oh bela, aqui no meio destes lençóis,
Possuía teu corpo formoso e enaltecia mais a tua alma...
E cada parte daquele inspeccionava com toda a calma.

Esquecíamos o mundo e o tempo p'ra pensar em nós dois;
Mergulhávamo-nos nas profundezas deste nosso ninho
De deleitosa paixão, pervertido amor e interminável carinho.

quarta-feira, abril 9

Choro

Os meus olhos inchados, cheios de dor,
São os olhos mais tristes deste mundo!
E com largas lágrimas meu rosto inundo
A chorar por ti, meu grande amor.

Choro porque vi o meu grande amor
Ser mergulhado em abismo profundo,
Por minha vida ser um jardim imundo,
Onde já não há viva uma única flor.

Choro porque te amo e te detesto;
Choro minha tristeza, por ter mágoa;
Choro porque para rir falta pretexto.

Choro porque me sinto uma nódoa;
Choro porque me sinto um simples resto;
Choro...choro... e choro "muita água"!

segunda-feira, abril 7

Vem

Vem com o teu angélico sorriso,
Chega-te até te colares em mim...
Vem chamar-me de Querubim;
Vem e dá-me tudo o que eu preciso.

Preciso que acabes com este amor indeciso;
Preciso - e quero-o muito - do teu sim,
Que a esta solidão desgostosa ponhas fim,
Que reponhas na minha vida o siso.

Quero que venhas com semblante cheio
De alegria, para escutar este carme
que, nesta hora, te dedico, sem receio;

Que me atendas a este sibilante alarme
do meu penoso peito, despedaçado ao meio.
Vem depressa... que isto está a sufocar-me!

terça-feira, abril 1

Mentira e Verdade

Sendo hoje o Dia da Mentira, lembrei-me subitamente destes versos interessantes escritos por alguém que realmente devia saber o que estava a dizer, ao concebê-los. Acredito que realmente a mentira e a verdade, embora sejam conceitos antagónicos, andam de mãos dadas, mas, se calhar, de costas viradas, marcando presença frontal, ora uma coisa ora outra, não podendo nunca coexistir. Passo a citar os famosos versos de que nunca me esqueci (desde que os vi pela primeira vez) e me recordarei eternamente:

P'ra a mentira ser segura
E atingir profundidade,
Tem que trazer à mistura
Qualquer coisa de verdade.

Teu Corpo Formoso

Um corpo caliente e formoso faz sempre alguma falta...
Porém, a ausência do teu, caloroso, até me tem doente.
Coladinho a ti, eternamente me regozijaria de contente,
Aparte de ti, tudo, sem excepção, tão somente me exalta.

A tua delicada e fina cintura de sereia, nem baixa nem alta,
Naquele andar compassado que a todos bloqueia corpo e mente,
Desnorteia-me por completo, deixa-me inconsciente e inocente...
E a cada passo teu em minha direcção, meu coração, excitado, salta!

Teus sempre lindos e tenros seios, de medida precisa e certa,
No teu peito, aconchegados e tímidos, firmemente se pousam;
O teu semblante arejado e altivo está presentemente alerta...

Tuas ancas ímpares ao mais musical e seguro rebolar ousam,
Feito ventoinha, que, religiosamente, o girar nunca desacerta...
Nisto tudo, meus olhos discretos no teu formoso corpo repousam.